Juntos construímos os sonhos

“Sozinhos, temos miragens, vemos o que não existe, mas juntos se constroem os sonhos”



“A fragilidade é o nosso destino"! Olhando para este quase último ano, constato que a pandemia nos fez ao mesmo tempo descobrir e sentir frágeis.

Neste percurso de descoberta, redescobrimos o valor da sobriedade, ou seja, o ser moderado e o não ser acometido pelos extremos, mas atermo-nos ao essencial. 

Esta característica, neste tempo de provação, pode fazer-nos também redescobrir o gosto pelo verdadeiramente essencial: a beleza das coisas simples e uma redescoberta das coisas que realmente importam na vida. E como assim foi!

Neste tempo, percebi que o valor da sobriedade, nos indica que a vida adquire sentido e sabor quando nos abrimos ao amor. Não conseguimos sozinhos: esta é a grande lição da pandemia.

Este tempo, foi e é também um tempo de reflexão, ou melhor: de "ver", de "escolher" e de "agir"

'O tempo de ver' é um processo de consciencialização, um 'tempo de ver melhor'. Não é que até agora tenhamos sido sempre cegos, mas a crise da pandemia obrigou-nos a focarmo-nos melhor na urgência de soluções não só necessárias, mas possíveis.

Já para “escolher”, precisamos um conjunto de critérios e um 'refúgio da tirania do urgente', um lugar de 'reflexão e silêncio'. Precisamos reaprender a rezar, ouvir a voz do Espírito e 'cultivar o diálogo, numa comunidade que nos apoie e nos convide a sonhar'.

É também 'tempo de agir', um tempo onde devemos propor as propostas mais ousadas que nos permitam traçar um 'caminho para um futuro melhor'. Sem medos, pois o medo só nos impede não de ir mais longe, mas sim de ir onde verdadeiramente temos de chegar.



A melhor forma de vos transmitir como foram e têm sido estes últimos tempos, e para mim o ter estado infetado não se resume ao período em que clinicamente estive de facto infetado, mas sim a todo este quase último ano, é partilhar convosco este texto chamado “Oração dos dias incertos” de José Luís Nunes Martins, um dos meus escritores preferidos:

Nestes dias incertos, peço-Te que me ajudes a ter mais confiança. A acreditar mais nas minhas forças e nos meus talentos.

Que eu escute mais e melhor os outros que sofrem de dificuldades, e traga eu para a minha vida o que lhes custou tanto a aprender.

Nestes tempos inconstantes, peço-Te que tenhas ainda mais paciência comigo, uma vez que ando perdido e com muita dificuldade em encontrar por onde seguir para diante.

Que eu tenha a paz suficiente para ver mais longe, para escolher o caminho que me eleva e que, apesar de todas as dúvidas, eu encontre forma de seguir adiante, passo a passo.

Nestas noites sem muito sono, peço-Te a alegria profunda de saber que a vida é um dom maravilhoso, apesar de tudo, e que, ainda que os males pareçam sem fim, eu encontre a esperança e a paciência capazes de lhes fazer frente.

Que eu seja capaz de sorrir, mesmo quando as lágrimas estiverem a lavar a tristeza do meu rosto. Que eu seja forte ao ponto de não desistir de mim, mesmo quando isso me parecer o mais certo.

Nestes dias cheios de nadas, em que pouco parece ter importância, peço-Te que me enchas o coração e a imaginação de sonhos, para que, como se fosse uma criança, me esqueça do passado e me despreocupe com o futuro, concentrando-me em encontrar as minhas alegrias de cada dia.

Que eu consiga chorar e rir com a mesma pureza e verdade, sentindo sempre tudo e brincando muito, sozinho e com outros, sem nunca me considerar mais crescido, maduro ou melhor do que qualquer outra pessoa.

Nestes afastamentos das nossas vidas, onde a tranquilidade parece ser impossível, peço-Te que me fortaleça para que não fale quando não é preciso, nem me resguarde no silêncio quando for tempo de falar. Por mais que me doa fazer o que é melhor.

Que eu ensine a mim mesmo que, se quase nada é certo, isso não significa que eu seja insignificante, sem sentido ou sem valor. Pelo contrário, quer dizer que sou chamado a ser sólido e forte para que no mar da instabilidade eu possa ser um porto seguro, um farol útil e uma brisa suave, capaz de inspirar os que estão a perder-se de si mesmos.

Nestes tempos sem chão, peço-Te que ilumines os meus caminhos, para que possa escolher melhor e assim alcançar a paz que busco.

Que eu seja capaz de amar os outros, aceitando-os como são, sem os julgar, lutando ao seu lado pelo que lhes és essencial. Sem buscar outra certeza que não saber que sou um instrumento importante para a felicidade daqueles com quem me cruzo na vida.

 

Nos dias em que o Mundo desabou, o que mais me assustava era o dia seguinte…o medo do dia seguinte e o não saber como seria esse mesmo dia seguinte! É isso que este vírus nos tira e devemos combater, o perder a esperança! A esperança da presença física, do toque, do abraço que nos entrega e congrega, tal como Cristo nos abraça a todos diretamente da Cruz, esse que é o maior abraço que o Mundo já viu!

Nesses momentos, e em cada dia que novamente acordava, aquilo que me dava e continua a dar força é aquela frase da nossa Madre Fundadora que diz “Deus olha-me sorrindo para me dar força e eu havia de perder a coragem?”. Este é o nosso maior aliado para tudo e contra tudo, o Amor de Deus! Um amor infindável, mas ao mesmo tempo insondável. E assim, nesses momentos era o sorriso de um novo amanhecer que me fazia continuar.



A melhor maneira de vos explicar é novamente recorrer a um poema, desta vez de Mario Benedetti, traduzido por Inês Pedrosa:

Não te rendas, ainda estás a tempo
de alcançar e começar de novo,
aceitar as tuas sombras
enterrar os teus medos,
largar o lastro,
retomar o voo.

Não te rendas que a vida é isso,
continuar a viagem,
perseguir os teus sonhos,
destravar os tempos,
arrumar os escombros,
e destapar o céu.

Não te rendas, por favor, não cedas,
ainda que o frio queime,
ainda que o medo morda,
ainda que o sol se esconda,
e se cale o vento:
ainda há fogo na tua alma
ainda existe vida nos teus sonhos.

Porque a vida é tua, e teu é também o desejo,
porque o quiseste e eu te amo,
porque existe o vinho e o amor,
porque não existem feridas que o tempo não cure.
 
Abrir as portas,
tirar os ferrolhos,
abandonar as muralhas que te protegeram,
viver a vida e aceitar o desafio,
recuperar o riso, 
ensaiar um canto,
baixar a guarda e estender as mãos,
abrir as asas
e tentar de novo
celebrar a vida e relançar-se no infinito.

Não te rendas, por favor, não cedas:
mesmo que o frio queime,
mesmo que o medo morda,
mesmo que o sol se ponha e se cale o vento,
ainda há fogo na tua alma,
ainda existe vida nos teus sonhos.
Porque cada dia é um novo início,
porque esta é a hora e o melhor momento.
Porque não estás só, por eu te amo.


Assim, e voltando ao início, concluo dizendo novamente que juntos se constroem os sonhos e é envolto neste Amor envolvente e permanente de Deus Pai que tudo o que sonhamos iremos um dia alcançar. Os obstáculos são para ultrapassar e os caminhos para percorrer. Percorre o teu caminho leve e desapegado e presta sempre atenção a quem contigo caminha…este é para mim o verdadeiro sentido da vida!

André Silva


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