Cartas para Teresa de Saldanha - Ir. Maria Elisa Galvão
Muito querida Teresa
É com o coração
cheio de alegria e gratidão que te escrevo. Em primeiro lugar, gratidão por me
ter recebido como filha e irmã nesta família espiritual que são as Irmãs
Dominicanas de Santa Catarina de Sena, fundadas por ti.
Na verdade, foi
um precioso dom do Espírito, que também tu acolheste com alegria e gratidão,
embora reconhecendo tua própria fragilidade e pequenez, e pressentindo que com
esse dom imenso viria também sofrimento e cruz. Mas confiaste que o amor
daquele que te escolheu é mais valioso e disseste: “feliz sou eu de sofrer por
amor de Deus, que tanto me amou”. Obrigada pelo teu SIM, pois através dele
abriste o caminho para que eu também, com tantas outras, pudesse por ele seguir
e encontrar a alegria na doação por amor.
É isso, a
vocação é um mistério e tu disseste que Deus tocaria o coração daquelas que
deveriam juntar-se a ti nesta obra. Então não sabemos, ou melhor, sabemos sim –
não foste tu que me escolheste nem eu que te escolhi, mas pelo misterioso
desígnio de Deus nos encontramos aqui e sim, sinto mesmo na pele que tu,
através das Irmãs, me acolheste com muito amor.
Eu agradeço
porque hoje compreendo o quanto Aquele que nos chamou quis que nossas
comunidades fossem um lugar onde podemos nos realizar plenamente, amarmos e
sermos amadas, colocando tudo o que somos e temos para amar e servir, e é nesta
doação que nos enriquecemos. Por isso, contigo, eu digo: “feliz, mil vezes
feliz sou eu, e por tudo dou graças a Deus!”
Não que ao longo
destes anos, na minha caminhada, não tenha me confrontado com desafios,
limitações, provações, dificuldades. Ao contrário, a cada ano, desde o início,
sempre os encontrei, dentro e fora de mim. Alguns obstáculos me pareceram mesmo
intransponíveis, ora em mim mesma, ora na comunidade ou na missão. Mas,
lembro-me que tu também os encontraste e deixaste-nos esta constatação:
“dificuldade sempre há para as coisas boas, o caso está em não desanimar”.
Eu admiro muito
o teu espírito e nos momentos em que me sinto fraca peço que Deus me conceda um
espírito como o teu, que dizias: “tenho este espírito que Deus me deu: quanto
mais dificuldades, mais força e coragem tenho para lutar”. Pois mesmo o que
aparentemente seria um fracasso, compreendeste que estava nos planos de Deus
para um bem maior: “os desígnios de Deus são impenetráveis”. “A vontade de Deus
se faça sempre e Ele, melhor do que nós, sabe o que nos convém. Portanto
digamos sempre: Fiat! Por seu amor, tudo se sofre, e é este amor que cicatriza
as feridas do meu coração”.
Parecias mesmo
como S. Paulo, que ouviu o Senhor lhe dizer: “basta-te a minha graça, pois é na
fraqueza que se manifesta o meu poder”. Pois tu dizias: “dificuldades são bom
sinal, depois será só alegria! Detesto enfronhar-me em tristezas!” Como admiro,
agradeço e identifico-me com esse teu ânimo. Mas sei que este é graça de Deus,
pois Jesus mesmo nos diz que sem Ele não podemos fazer coisa alguma, nada de
bom. Mas com Ele, tudo podemos suportar.
Não quero me
prolongar demais, apenas não posso deixar de mencionar outro motivo da minha
gratidão e alegria: pelas irmãs maravilhosas que fazem parte da nossa família
religiosa! As que me antecederam e não cheguei a conhecer, apenas leio algumas
poucas linhas que as secretárias deixaram registrado sobre elas. Algumas em seu
silêncio na oração e no trabalho humilde e sacrificado da comunidade, outras
grandes fundadoras e grandes educadoras, como tu. Cada uma com a sua
originalidade, na doação fiel e heroica de cada dia, segundo a vontade de Deus.
Estas foram levantando as paredes de santidade, do edifício que é a nossa
Congregação, e que nos têm sustentado.
Obrigada enfim
pelas irmãs maravilhosas e cheias de garra, que tive a graça de conhecer e com
as quais já trabalhei, por tantas comunidades por onde já passei. Realmente sou
privilegiada neste sentido, de conhecer a realidade de muitas missões onde as
Irmãs estão atualmente, nos vários países. Seja nos colégios, cada uma na sua
função, mas todas com o mesmo objetivo de formar o espírito, a mente e o
coração das crianças e dos jovens... principalmente com o testemunho, é claro,
que fala mais que mil palavras. Seja nos lares ou nas casas de missão, que
capacitam crianças, jovens, mulheres e famílias e atendem os pobres e doentes.
Trabalhar e servir ao lado dessas irmãs é sempre uma alegria e um consolo para
mim. Ter o privilégio de encontrar rostos do povo simples e humilde, com um
sorriso brilhante de gratidão no olhar, é algo que tem ficado gravado no meu
coração, que vai procurando alargar sua tenda para acolher mais outros ainda.
Eu imagino agora
também a tua alegria e gratidão para com Deus, porque Ele é fiel e estavas
certa ao escrever: “se a obra é de Deus, não morre!” É claro que não, porque ‘a
caridade não passa jamais’! Todo o bem que começaste a semear, outras
continuaram e agora é a nossa vez. E esse bem, já não se pode contar, tem se
multiplicado tanto que eu lembro (sem exagero) da promessa que Deus fez a
Abraão: ‘levanta os olhos e conta as estrelas, se puderes’.
Por fim,
gostaria de pedir um favor, que não me podes negar. Nós somos dominicanas;
lembras que S. Domingos garantiu aos seus: “Do Céu, de junto de Deus, eu vos
serei mais útil”. O que eu peço é que tu, como S. Domingos, também cumpras essa
promessa e nos ajude. Que as mais novas que vêm chegando, milagres de Deus,
possam realizar-se plenamente e serem felizes dominicanas. Ajuda-nos a
discernir os caminhos de Deus a cada momento. Pede a Deus por todas nós, suas
filhas, para que também sejamos santas, não de altar, mas com a mesma misericórdia
e caridade grande e verdadeira, que é característica da Família Dominicana. Para
conseguirmos a graça de, quando chegar a cruz, com a dor que não compreendemos,
possamos ter a mesma fé, a esperança e a paz que conservaram teus olhos
brilhantes até o fim de tua vida.
Obrigada por
tudo, Madre Teresa de Saldanha! No coração de Deus estamos todas juntas!
Tua filha, Ir. Maria Elisa
S. Paulo, SP - 22 de março de 2021
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